31 de janeiro de 2013

Poesia &m Letra (I)

Por: Rafael Mota
         


          

          Eufórico como de costume, hoje quando ouvia uma playlist cirurgicamente desorganizada e andava pela cidade, pensei em começar uma série para o blog. Com os fones já como partes inerentes dos meus ouvidos, Roger Waters parecia estar em minha frente a olhar diretamente pra mim, Renato Russo me dava tapinhas nos ombros e Gessinger me dizia com os olhos e com um sorriso sincero na cara: "Faça isso, garoto!" Pois bem, é o que farei. Não sei com que regularidade aparecerão novos posts, talvez semanalmente, talvez mais frequente que isso. Maldita euforia! As postagens irão conter letras ou trechos de letras de variadas músicas, variados estilos, variadas línguas e variados gostos, claro. Letras que me inspiraram e me inspiram, letras que inspiraram gerações, letras que ninguém conhece, poesias em forma de canções. Aliás, música e poesia são, há muito tempo, um casal perfeito. Eternamente entrelaçados em algum lugar sagrado. Pode ser que eu queira, vez ou outra, acrescentar alguma informação, alguma nota ou explicação nos posts, com o tempo isso tende a ficar mais comum.
          O objetivo da série é compartilhar de um pouco de cultura musical, às vezes um pouco de informação, quebrar preconceitos e principalmente compartilhar boas músicas, letras que são mais para refletir do que para simplesmente "curtir". Se eu não fosse apresentado à boa música desde pequeno, sabe lá o quão pouco poético eu seria, se é que seria, se é que sou. Benditos irmãos mais velhos que ouviam músicas de qualidade, não sempre, mas com frequência considerável. Graças a eles. Graças a internet. Graças ao antigo toca fitas que me salvava do tédio em casa e na carvoaria onde ia com meu pai e minha inseparável fita (gravada por mim mesmo) do Detonautas. Graças ao Detonautas, ao Pensador, graças ao Rock, graças ao Rap... Graças a variedade cultural.
          Hoje, mais do que nunca e menos que amanhã, percebo que uma boa música independe do gênero, se tem letra ou não (sem letra quer dizer instrumental, não entendam de outra forma), independe de qual país seja, com qual língua foi escrita ou de quais instrumentos foram usados na composição da mesma. Boa música é toda aquela que consiga passar a mensagem, o sentimento. Boa música é a que tem voz, é aquela que serve como o transmissor, conectando o músico ao ouvinte, passando a mensagem desejada. Postarei nesta série músicas vivas, que dizem por mesmas as mensagens que precisam ser ouvidas. Boas músicas graças à poesia e, muitas vezes, graças a euforia do poeta compositor. Espero que gostem.


                                                                                               ______


          Como este é o primeiro post da série, a primeira poesia em letra - que é bastante conhecida -, não acrescentarei muita coisa, até porque nem precisa, pois esta é bem autoexplicativa e ao mesmo tempo profunda. Cada um tem seu modo de interpretar, cada qual com seu ponto de vista, e essa é uma das magias da poesia. O fato é que esta música me inspira bastante, sempre que o aleatório de minha playlist me agracia com os versos do Legião eu começo a cantar sem ver, me empolgo e... Quem nunca? Amo a reflexão que esta música traz e quase consigo tocar a carga de energia escura e desprezo pela humanidade em cada estrofe. Talvez por isso eu me identifique tanto. Essa indignação pertence a mim. Não preciso falar mais, até porque tal música é a chave da inspiração para um dos textos que postei aqui no blog, não só ela, mas o desprezo para com a humanidade também. Desprezo tal que percebi quando me deram espelhos, assim pude ver meu mundo doente. Quem me dera, ao menos uma vez, que todas as pessoas refletissem sobre essa música, ou sobre qualquer coisa mais complexa do que futilidades do dia-a-dia.

                                                        
 


                                                                            Índios - Legião Urbana


Quem me dera, ao menos uma vez,
Ter de volta todo o ouro que entreguei
A quem conseguiu me convencer
Que era prova de amizade
Se alguém levasse embora até o que eu não tinha.

Quem me dera, ao menos uma vez,
Esquecer que acreditei que era por brincadeira
Que se cortava sempre um pano-de-chão
De linho nobre e pura seda.

Quem me dera, ao menos uma vez,
Explicar o que ninguém consegue entender:
Que o que aconteceu ainda está por vir
E o futuro não é mais como era antigamente.

Quem me dera, ao menos uma vez,
Provar que quem tem mais do que precisa ter
Quase sempre se convence que não tem o bastante
E fala demais por não ter nada a dizer

Quem me dera, ao menos uma vez,
Que o mais simples fosse visto como o mais importante
Mas nos deram espelhos
E vimos um mundo doente.

Quem me dera, ao menos uma vez,
Entender como um só Deus ao mesmo tempo é três
E esse mesmo Deus foi morto por vocês -
É só maldade então, deixar um Deus tão triste.

Eu quis o perigo e até sangrei sozinho.
Entenda - assim pude trazer você de volta prá mim,
Quando descobri que é sempre só você
Que me entende do inicio ao fim
E é só você que tem a cura pro meu vício
De insistir nessa saudade que eu sinto
De tudo que eu ainda não vi.

Quem me dera, ao menos uma vez,
Acreditar por um instante em tudo que existe
E acreditar que o mundo é perfeito
E que todas as pessoas são felizes.

Quem me dera, ao menos uma vez,
Fazer com que o mundo saiba que seu nome
Está em tudo e mesmo assim
Ninguém lhe diz ao menos obrigado.

Quem me dera, ao menos uma vez,
Como a mais bela tribo, dos mais belos índios,
Não ser atacado por ser inocente.

Eu quis o perigo e até sangrei sozinho.
Entenda - assim pude trazer você de volta prá mim,
Quando descobri que é sempre só você
Que me entende do início ao fim
E é só você que tem a cura pro meu vício
De insistir nessa saudade que eu sinto
De tudo que eu ainda não vi.

Nos deram espelhos e vimos um mundo doente
Tentei chorar e não consegui.


                                                                                      Arrepios e mais arrepios.

29 de janeiro de 2013

gotas de Liberdade

por Jéfferson Veloso.


A chuva cai lá fora
e eu aqui trancado em um quarto de apartamento qualquer
dizendo a mim mesmo que estou seguro da maravilha caída do céu.

A chuva cai lá fora
e eu vendo cada gota se escorrer pela janela
imaginando que se tal não existisse
seria em mim que haveria o escorrimento de tamanha beleza.

Lá fora
Eles se protegem
Inexpressivos
Calados
Sugados pelo sentimento de auto-proteção
Alguns procuram abrigo por baixo de telhados ou varandas
Alguns vestem suas armaduras em forma de capa
Outros com seus guarda-chuvas em posição de escudo
Procurando alguma forma de fugir de algo que não veio fazer mal algum.

chuva...

Eles estão tomados por este sentimento ininterrupto de medo
E eu aqui, me apoderando em inspiração
Me perguntando o que estou fazendo do lado de fora da chuva

Da mesma forma que um dia me disseram que ela era a vilã da história
Quero mostrar-lhes que a chuva é a mais bela mocinha
Só esperando alguém para amá-la.
E ela não tem pressa disso
aparecerá sempre que puder,
e, aos poucos, eles irão perceber que ela sempre ficou do nosso lado
E da mesma forma que um chuvisco pode se transformar em tempestade
Nossos sentimentos também podem mudar.

E eu aqui, escrevendo para você
Adorável chuva
Escrevendo para você, enquanto cai aí, do outro lado do vidro da janela
Aqui, trancado
me sinto na dúvida se estou protegido ou preso
dentro deste cubículo de cimento e areia
ao mesmo tempo em que tu cais aí fora
vangloriando sua total liberdade...




-



Se precisarem de algo, me procurem na chuva.
Estarei onde ela estiver.

26 de janeiro de 2013

Fragmento do intangível


Enquanto ainda irrompem lampejos de poesia
Há sangue nos altares de pedra
Existe fome nas avenidas
E encanto nas folhas que não desabam
Micro espetáculo de miudezas desimportantes

Corações corroem-se em misérias e egoísmos
Corpos desiludidos e expressões vagas
Copos vazios e mentes doentes
E miolos espalhados pelas paredes
Quando comprimidos não solucionam a incompreensão

Entulho nas arestas das horas
Desesperança no asfalto morno
Ápices inatingíveis e fossos inescapáveis
Panoramas ideados para pulverizar a solidão

Falsos esboços
Bolsos rasgados
Trocados miúdos
Refluxos estéreis do cotidiano
Sopros do tédio
Ruína dos anseios previstos

Máscaras que sufocam os fins
Mentiras abafadas no solo das ficções
Sussurros inaudíveis e renúncias estridentes
E abandono

Descrença no amanhecer
E delírio
E devaneio
E desassossego.

É improvável não sofrer no oscilar hipotético e indiferente do destino
A mais coerente das razões é ainda fragmento do intangível
E a súbita emoção, resplendor do inexistente.


De André Araújo, retirado de Colettivo.

23 de janeiro de 2013

DesIndivíduo




Sou de tempo algum...

Sinto saudades das armas brancas,
Do tempo em que brincávamos de ser especiais,
De quando gritávamos pelas rues longues
Unidos por uma só frase.

Sinto saudades dos reis e rainhas,
Do tempo em que galopávamos ao vento,
Nos largos campos cheirando a mato fresco e orvalho,
Unidos por um sentimento.

Sinto saudades dos tempos modernos,
Do tempo em que tínhamos voz ao ficarmos em silêncio,
De quando as ruas eram pequenas
Unidas por uma só sede.

Sinto saudades da abundância de tecido, das tintas em corpos dançantes,
Do tempo em que as roupas não nos usavam, da nudez
De quando cantávamos ao fogo
Unidos por uma só crença.

Sinto saudades daquela prisão,
Do tempo em que nos humilhavam enquanto sorríamos de chorar,
De quando nos espremiam
Unidos por apenas ser.

Sinto saudades daquelas montanhas,
Do tempo de cavalos magros e mulas,
De quando heróis coexistiam
Unidos por um ideal.

Sinto saudades da terra dos grandes dragões,
Do tempo em que ser natural era inteligente,
De quando não havia a gente
Unindo pedras para destruir.

Sinto saudades da antiga escravidão,
Do tempo em que os escravos ao menos sabiam ser,
De quando a vida do senhor era um preço justo
Pela união dos oprimidos.

Sinto saudades dos velhos deuses,
Do tempo em que estes representavam tudo o que há de bom,
De quando não nos aprisionavam em representações e promessas,
E de quando se uniam em harmonia.

Sinto saudades da grande explosão,
De certa forma nostalgia e admiração,
E de tudo que sinto saudades,
Anseio que volte ao uno.

Sinto saudades de hoje e de ontem,
Não mais do amanhã,
E de tudo o que eu almejava
A poeira se espalhando nem sequer pousou.

Sinto pena de mim e do mundo,
Enfermos com a mesma doença,
Porém eu só tenho os sintomas
E a cura, infelizmente, ele não há de encontrar tão cedo.

Sinto saudades do vazio,
Do tempo e do espaço,
E de não me sentir perdido neles,
Pois sequer me sentem, pois sequer sinto.

Sinto-me aqui
E ao mesmo tempo antes.
Tenho saudades da certeza
De que não pertenço ao amanhã.

...sou de lugar nenhum!

21 de janeiro de 2013

Crayon.


            Olhava pela vidraça empoeirada da janela do quarto e via a chuva cair torrencialmente. A fumaça do cigarro barato enevoava seus olhos e a maquiagem escorria pelo rosto. Como uma chuva negra. Uma mescla de lágrimas e Crayon. Como ela podia ter feito aquilo? Ligado tão tarde da noite, com a voz mais bonita existente, chamando-a como antigamente...

         Como diria não? Não conseguia ser assim. Mesmo depois de tudo, não a deixaria lá, sozinha, clamando por carinho.

         Carinho que ela mesma havia dispensado meses antes.

         Tudo havia sido como se nunca houvesse existido um basta entre elas. Entendiam-se tão bem..! Não precisavam falar, explicar, dizer palavras simplesmente para gastarem tempo.

         Ah, o tempo... Como tudo havia passado rápido. Num momento, a Felicidade. No outro, o Basta. E agora, o Chamado.

         Olhando para o lado, via as coisas dela espalhadas por toda parte. Calcinha, bota, cachecol, vestido.. O vestido preto que lhe dera de aniversário.

         A escolha havia sido bem pensada...

         Ao longe, o som do chuveiro se misturava com o cair da chuva. Não era fácil imaginá-la debaixo daquela água quente, lavando seus cabelos longos e avermelhados em meio a todo o vapor. Mas elas nunca haviam tomado banho juntas.. Era como uma regra não falada, mas prontamente seguida. Não que não fosse do seu desejo deixar-se relaxar junto dela.

         Mas não.

         E naquele momento, elas não eram mais do que duas pessoas compartilhando algo já não mais completo. Como um espelho remendado.

         Levantou-se e foi até o espelho da cômoda. Os perfumes ainda se achavam lá. Todos doces. Não havia nenhum do seu agrado. Detestava perfumes. Mas eram dela.

         Apagou o cigarro e começou a retirar a maquiagem que lhe enfeitava sombriamente o rosto magro. Aquele Crayon a deixava com os olhos vermelhos, mais vermelhos que o normal. Sua pele estava grudenta e, agora percebia, ela havia deixado um pequeno arranhão em sua bochecha. Lembrança, pensou.

         Sentiu o celular vibrar sobre a cômoda, coberto por peças de roupa. Era o dela. Uma mensagem. Suspirando, pegou-o e clicou na tela.

         “19h. Pontual, como sempre. Espero em frente. Te amo.”

         Paul.
         O remetente.
         “Te amo”...

         Olhou para o espelho e se viu, encarando uma realidade crua e mais vívida do que os momentos passados naquele quarto algumas horas antes. Nada mudaria, pois já havia mudado.

         E precisava ir. Acendeu um cigarro, vestiu seu casaco preto e coturnos militares. Destrancou a porta e recebeu a chuva fria em seu rosto, molhando qualquer vestígio de lágrima que pudesse existir.

18 de janeiro de 2013

O Estrangeiro Fantasma






        

          Um dia frio. Bem mais frio do que costuma ser. Choveu por todo o decorrer da manhã e só há pouco se estancou o chorar dos deuses. Sim, eles estão decepcionados – inclusive comigo -, assim como eu estou. No muito molhado caminho de volta do trabalho, que já devo ter percorrido centenas de vezes, me deparo com uma paisagem nunca vista ou até mesmo sentida antes. O que me espanta é justamente este fato. Será que ao fazer o caminho de ida eu estou ainda dormindo para nunca ter visto todos aqueles arbustos, aquelas flores, aquela vida que reflete como uma manhã radiante de verão, aquela vida que cheira a liberdade? Será que ao voltar para casa estou sempre demasiado cansado e entediado para não ver aquele longo caminho de inspiração? Estou me tornando mais um parafuso nessa complexa máquina, nesse aglomerado de sujeira encoberta pelos imensos tapetes da ignorância!
         
          Embora minha mente insista sempre em me deixar alerta quanto a isso, embora a chuva de hoje tenha me lavado a alma e os olhos, fazendo-os brilhar novamente, não parece haver caminho seguro a se seguir por aqui, nesse amontoado de caixotes que mais parecem grandes e aconchegantes celas de uma prisão invisível, uma prisão invertida, pois quanto mais se pensa que é livre, mais se está preso. Prisão corporal e da mente, um eterno confinamento de corpos e pensamentos - quando estes existem -, e em ambos o cárcere é produto do medo, em todas as suas impiedosas formas. "Veja o quanto nosso sistema de proteção é eficiente!"; "Olhe só o tamanho dessa muralha!"; "Bom dia, jovem! Temos câmeras, alarmes, cercas, botão do pânico...". Pra qualquer lado que se vá, pra onde quer que você olhe é sempre a mesma coisa, as mesmas peças em corpos diferentes. Os vírus agem assim, vagarosamente, célula por célula multiplicam-se, sem dar sinal que estão por ali. Quando se percebe já é tarde demais. Não é tarde demais! Minha cabeça está marginal a isso tudo, mas meu corpo parece estar cada vez mais dependente em permanecer nessa engrenagem.
         
          Observo minh’alma saindo pelo umbigo – e ela também me observa -, tentando escapar desse corpo quase infectado, mas ambos resistem e esta luta parece não ter fim. Presos um ao outro, vão continuar assim enquanto eu tiver controle sobre meus atos, pois sobre a mente eu já não tenho certeza. Não! Não é isso que eu quero, mas seria permitido ter que me adequar enquanto amadureço - como creio que venho fazendo - não com felicidade, mas mesmo assim muito bem? - pergunto-me. Marginal a isso tudo, um estrangeiro. Aonde procurar pelo antídoto? Existe antídoto? Concluo que eu sou o antídoto, eu sou a minha própria cura, só eu posso ser, porém ao mesmo tempo sou a perdição! Sou? Nem eu me conheço. Olho ao meu redor agora e tenho convicção de que estou mesmo perdido nesta selva, e que os prazeres de sua complexidade não me pertencem. Até quando aguentar? Por que não surtar de uma vez, se é por essa liberdade que minha mente se rebela? Mais uma vez me perco em perguntas. Seria isso uma evolução?


17 de janeiro de 2013

Mnhia dcoe e qeudria Ecsirta...

Escrever...

Que mágica essa tal de Escrita!

Letrinhas unidas em prol de inúmeros significados...

Mê de um:
A!
M!
O!
R!
Temos o quê? O quê?

Amor... Amora, Ramo, Roma, Omar, Oram, Morar...

Omar vai morar em Roma, onde pessoas oram por amor, perto de árvores frondosas do ramo daquelas que nos dão amora...


Sou eu a escrever?
Sim!
Sou eu a própria escrita?
Sim!

E não.

Opino por ela, mas crio por ela.
Sincerizo e também fantasio.
Digo que sim ou que não, sem me comprometer...

Depende, sempre depende!

Divago e opino.
Critico e bobageio.
Escrevo, escrevo, escrevo.
E nada digo!

Ou digo muito, pouco escrevendo.

Dou vida a mundos e coloro o meu.
Sou, sem ser.
Nem sou, sendo.

Ah, escrita...
Doce objeto da minha obsessão...
És tão Falsa e Verdadeira quanto os
Desejos que esconde.
Deusa da vontade de quem tem apenas 
um Objetivo Real.


Torná-la Escrita.

12 de janeiro de 2013

Esquerdismo, Imperialismo e Revisionismo!

    

 Por: Thiago Vidal - Vermelho à Esquerda

     

Um jovem que se diz revolucionário mas não é comunista, é um uma pessoa num quarto trancado com uma venda e de mãos amarradas. Não enxerga seu caminho, seu objetivo, não tem ferramentas para atingi-lo, não sabe o que faz, nem para onde vai. Não existe a luta por uma sociedade “mais igualitária”, existem dois modelos conhecidos, um excludente e desigual, outro igualitário, não existem outras gamas, porque são modelos de apenas duas classes, classes estas que a História provou ter interesses antagônicos.

O grande capital nunca conciliar-se-á com os interesses de seus súditos, pois se uma empresa abrisse mão de seus lucros, perderia seu principal propósito que é o de lucrar cada vez mais. O intuito de toda aglomeração de capital, das grandes empresas, é controlar nichos cada vez maiores de mercados e a ideia de igualdade do capital é justo essa, uma meritocracia forjada, onde a escola dos liberais, austríaca, Friedman, Mises, acreditam seriamente que uma empresa criada em um dia pode concorrer em igualdade com uma megacorporação dominante do mercado. Ignoram dois conceitos básicos, a capacidade do capital de gerar mais capital, fazendo com que quem tem mais dinheiro, sempre possa gerar mais riqueza, e a propriedade do capital de distorcer e influenciar o próprio mercado.

Um exemplo do capital gerando mais capital são os bancos, expandindo infinitamente sua capacidade de produzir riqueza e engolindo todos os recursos a sua volta, tomando casas, carros, bens de inadimplentes. Outro exemplo seria do capital distorcendo o mercado, a capacidade de manipulação e propaganda faz com que um país onde as pessoas não tenham casa, e/ou comida, consumirem produtos como tablets, como pode um mercado carente de produtos de necessidade básico, ter uma demanda por algo dispensável a vida humana? A resposta está no modelo do Antigo Regime: Existe em toda nação um Primeiro e Segundo-Estado que consomem supérfluos, pois não tem o padrão de renda igual ao do resto da população, a classe média alta de um país X, não tem um perfil tão diferente da classe média dos EUA, eles respondem ao mesmo perfil e cumprem o mesmo papel no capitalismo. Por isso há uma ideia cosmopolita dessa classe, no capitalismo as fronteiras são mero referencial para pessoas, mas o fluxo de capital é livre. Sendo assim, as sociedades não são divididas entre nacionalidades e uma Divisão Internacional do Trabalho, cada país tem sim seu papel de contribuição com o capitalismo internacional, mas no âmbito de pessoas e mercado de consumo, há uma casta que consome e outra que é explorada.

Por isso em um mesmo país há uma classe que consome em abundância, enquanto outra conta as migalhas, a diferença entre o Terceiro-Mundo e o Primeiro-mundo, é que no Terceiro-Mundo, se você dividisse tudo produzido sem mudar o sistema, não seria suficiente para todos, e no  Primeiro-mundo, você poderia fartamente manter todos em um nível digno de vida, sem haver ricos, nem miseráveis. Inclusive, Marx previu a revolução socialista no centro do capitalismo, não em sua periferia, por isso há um certo problema prático ao se levar em conta as particularidades dos países da periferia, a sua luta pela emancipação histórica, liberta-se da submissão internacional, tudo isso muitas vezes se confunde com o discurso da esquerda marxista, mas sempre caem no vício da social-democracia, acreditam que com uma autonomia internacional maior, poderá desenvolver um capitalismo reformado, menos excludente. Só ignoram a natureza do próprio sistema que tem como intuito gerar cada vez mais riqueza, concentrando cada vez mais as riquezas entre um grupo cada vez menor de indivíduos, sendo que a estrutura que possibilita essa produção de riqueza, é a circulação da mesma, e quanto mais concentrada a riqueza, menos ela circula, gerando as crises cíclicas do capitalismo. É como uma corrente elétrica, uma vez interrompida em qualquer ponto, a energia deixa de fluir em todo o sistema, como na Crise de 29, quando a bolsa dos EUA, condenou todo o capitalismo, é uma propriedade do capitalismo ser supranacional, o Estado é mera ferramenta do imperialismo, não existem um interesse do Estado, existe um interesse do capital. Os EUA não têm de fato necessidade de petróleo, possuem uma capacidade tecnológica de produzir energias alternativas, a necessidade de petróleo coincide é com a necessidade de lucro de um mercado, assim como a necessidade de lucro de sua indústria bélica. A maior prova disso é a desaprovação da maioria da população das intervenções militares, não é um interesse da comunidade que representa o Estado, mas das empresas visando seu lucro e utilizando o Estado como ferramenta.

O imperialismo não tem bandeira, a burguesia não tem pátria, o que importa é salvar seus investimentos, seus lucros. Por isso, não deve haver divisões entre os trabalhadores, por isso o comunismo é internacionalista, porque é impossível um país resistir sozinho a toda uma estrutura internacional criada para proteger o capitalismo, diferente de quando quase metade do mundo era comunista.

Por isso não se deixe enganar, a social-democracia é um mero instrumento de iludir os trabalhadores, mas não enfrentar os antagonismos históricos de classe, e renegar a luta de classes, tem um custo muito alto, existe um momento em que esses interesses não tem mais como seguirem paralelos, os projetos encontram seus pontos antagônicos e é quando o Estado burguês ressurge ou vai a falência. Um exemplo seria a Grécia, o Estado social-democrata faliu, não existem condições de se manter como está, só há duas opções, uma revolução da classe trabalhadora, ou aceitar passivamente todas as medidas de austeridade e a refundação do Estado-liberal, sendo o Estado social-democrata também um Estado essencialmente burguês, mas com suas limitações, uma armadilha para os inocentes e despolitizados.

                                                                                      

                                                                                                          *




          Há tempos venho planejando escrever sobre tal assunto mas, como já devem ter percebido, prefiro mais me expressar, aqui, através da subjetividade fictícia do que através da objetividade e compromisso da opinião. Curiosamente ao visitar uma das páginas frequentes em meu dia-a-dia, me deparei com este ótimo texto que expressa uma opinião muito parecida com a minha, quiçá idêntica. 

          São tantos os fatores que fazem do modelo capitalista insustentável que, se fossemos citar todos eles e explicar detalhadamente, escreveríamos alguns livros, porém acho muito importante que se cite aqui a sua incompatibilidade com a capacidade finita do planeta em oferecer recursos naturais. Talvez só este assunto já renderia muitas páginas de argumentação, mas isso fica para um futuro texto, de opinião própria preferencialmente.


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Texto escrito por Thiago Vidal e retirado do blog Vermelho à Esquerda.