16 de outubro de 2013

Monday

     Inescrupuloso. Ininterrupto. Seriam palavras que resumiriam meu sentimento desconsolado de dormir às cinco e meia e ter que acordar meia hora depois. Se bem que, se tivesse algo para fazer e repetir, com certeza seria o que eu faria.
     
     Eram dez horas de uma noite fria e tenebrosa, que mais tarde, como um camaleão sob atitude suspeita, transformar-se-ia a ponto de perder sua essência e se dissipar, se perder e misturar-se a outras doravante percebidas.  Tudo era pacato e chato. Outros humanos se divertindo, digladiando entre si por um mísero pedaço de um farto banquete, dançando ao som de uma musica indesejável e inconveniente,  tudo normal.  Mas algo me fez sair desse estado de introspecção e fuga dessa débil realidade. Um ser de lábios cálidos, olhar gélido e pele morna. Merda. Aquela imagem chegou de supetão deixando a mim, um ser tão frio e pessimista, com sensações desconcertantes.
     A festa parou. Para mim é claro. Espere, eu já a havia visto em um sonho dois ou três dias atrás, e a mesma sensação. Dei um passo à frente, mas voltei. Recuei como um coelho sob o ataque funesto de um lobo dos Alpes. Mas, por quê? As mulheres eram tão previsíveis para mim, seus movimentos eu previa, seus pensamentos eu lia e seus lábios eu beijava, mas de forma apática e sem emoção. Sim, emoções eram proibidas.
    Mas, como a seta disparada por um exímio arqueiro, ela deu um passo em minha direção e disse, de forma bucólica e ambígua.
   - Oi.
  Bom, eu respondi com um ar letárgico.  Seguiu-se então um diálogo qualquer que não me convém falar-vos por agora.
Quando dei por mim estava falando sozinho, com um copo de whisky e uma imagem inculta no fundo do copo. Enquanto isso ela estava no outro lado do pequeno salão conversando com algumas pessoas.
   Mas espere, em um momento abrupto ela se desprende daquele grupo, daquelas pessoas, e corre em direção a um dos quartos da casa. Ela passa por mim e o reluzir de uma lágrima maculando seu rosto limpo, deixando um rastro desastroso e a sulcar sua gélida face,  incomoda-me os olhos. Em um instante sutil e maquinal, como se não houvesse outra opção eu a sigo, e ao entrar no quarto, a única imagem que me recordo é a de seu corpo tristemente mórbido sobre a cama.
    Sentei-me ao seu lado. Perguntei-lhe o que havia ocorrido. Ela, por sua vez, com uma voz trêmula, cujas sílabas eram interrompidas e dificultosas pelo correr das lágrimas, respondeu apenas com um apertar, aflito, dos olhos e da minha mão. Sinceramente, talvez o motivo de fato não me importasse muito. Acheguei-me ao seu lado e ela colocou sua cabeça em meu colo. Senti o deleitar de seus cabelos apátridas descansando sobre a superfície trêmula das minhas pernas. Concupiscentemente  deitei ao seu lado, e vendo a escuridão de sua cabeleira voraz a me aliciar fui sorvido para uma dimensão desconhecida, restando apenas à sensação, cumprir seu dever ingrato de desvendar o que era o objeto incômodo preso ao meu punho, que desconcertava nossas atadas mãos.
Como um desalmado que acaba de voltar do hades, acordei procurando o precioso ar que eu tanto precisava, já irritado - ou totalmente amedrontado ainda não sei – olhei para o despertador que estava a me aborrecer no bolso do alheio parente ao meu lado. Eram seis horas de uma segunda-feira pacata e rotineira.  Olhei para o lado direito, com certo desconcerto no pescoço, e contemplei um grupo de pessoas eufóricas olhando em minha direção e com gritos ensurdecedores diziam que alguém havia acordado. Cinco anos em coma? Sim caros leitores, eram seis horas da manhã de uma segunda-feira sem escrúpulos.

Por: Victor Vinícius A. Mendes

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