3 de novembro de 2012

são lembranças minhas

por Jéfferson Veloso.

Minha sincera lembrança
Meu mais puro passado
Aquela pequena criança
Com um futuro quase premeditado


Nós, seres humanos, somos fruto derivado daquilo que já vivemos, cada qual com sua história, cada qual com sua maneira de viver.
Lembro-me vagamente de meu passado:
Me lembro de quando eu e minha família morávamos em uma casinha alugada, quase caindo aos pedaços, com dois cômodos, sem banheiro e faltava luz quase todo dia.
Me lembro de ter tomado uma cartela inteira de remédios de cor vermelha a ponto de minha urina sair vermelha também.
Me lembro de quando papai trabalhava de motorista de caminhão numa indústria de laticínios e sempre me chamava de manhãzinha para ir com ele às fazendas para pegar os latões cheios de leite para levá-los à empresa. Eu tirava os latões vazios do caminhão e ele pegava os cheios.
Me lembro que minha mãe começou a dar aulas na Escola Estadual Sebastião Simão de Melo à noite, e tinha que levar eu e minha irmã para a escola, já que papai estudava à noite e não tínhamos dinheiro o suficiente para contratar uma babá. Eles sempre revezavam: no 1º horário eu ficava com mamãe, e Jéssica (minha irmã) ficava com papai, já no 2º horário mudávamos de lugar. Eu e ela éramos sempre o centro das atenções na sala. De um lado, papai não conseguia estudar, do outro, mamãe não conseguia dar aula direito.
Me lembro da primeira vez que meus pais me deram presentes. Como eles mantinham a política presentear na mesma quantidade para ambos os filhos, Jéssica também ganhou. Chapéu de palha, jaquetinha de couro, bolsinha do Mickey, balão em formato de avião. Tudo uma grande maravilha para quem se contentava em brincar com sabugos de milho, dizendo ser seus carrinho de boi.
Me lembro de quando meu pai me levou para dentro da indústria de laticínios, e vi todo o processo de modelagem de queijos, muzarelas e derivados do leite. Desde então, sempre que meu pai estava lá eu ia também, até a empresa falir, já que a Parmalat pagava melhor o litro de leite para os fazendeiros da região, fazendo com que essa empresa falisse devido a não ter mais matéria-prima. Pois é.
Me lembro da época em que saímos dessa casinha alugada e fomos morar na casa onde meus pais moram até hoje. Esse dia, essas singelas 24 horas foram umas das mais gratificantes em minha vida. Vi um sorriso vivo em cada um do 3 integrantes da minha família (4 comigo), não só porque estávamos com melhores condições de vida, mas porque nossa vida já era ótima e desde o momento até então ficaria muito melhor.
Me lembro que mamãe convidou todos os pedreiros que fizeram nossa casa para almoçar quando estavam fazendo a varanda de casa. Nesse dia, tinha um tambor cortado ao meio cheio de água cinzenta devido à mistura de cimento, e os pedreiros, juntamente com papai estavam brincando de jogar essa água um no outro. Eu nem chegava perto. Mas, um certo momento, estava distraído quando me vem por trás um balde cheio dessa água que eles pegaram com o simples intuito de me sujar por inteiro. Chorei, chorei, chorei de molhar o rosto, manchar a camisa e fazer lodo nos pés. Mas foi de susto, por que depois entrei na brincadeira também. Dia simplesmente magnífico.
Me lembro de quando entrei na escola, ou melhor, no Prézinho (hoje chamado de Introdutório). Quase todos os dias eu ficava de castigo no quarto escuro. Lá eu fiz muitos amigos, inclusive um na qual posso chamar hoje de irmão: Rafael de Freitas Mota.
Me lembro de quando eu e Rafael colocamos fogo no campo de futebol de Cana Brava-MG. Era uma época de estiagem e como o campo não é irrigado, secou também. Então eu e ele fizemos uma trilha de grama seca e decidimos colocar fogo nesse grama. De começo o fogo estava apenas na trilha. Depois eu tive que ir pra casa. Quando voltei me deparei com uma cena que não esqueço nunca: o fogo tomando conta do campo todo e Rafael tentando apagá-lo com sua sandália arrebentada. Fiquei estático, nem conseguia me mover para pegar um balde d'água, nada. Rafael me avistou e veio para minha casa se "esconder da polícia". Então ficamos ali, assistindo o fogo tomar conta de metade do campo enquanto minha irmã dizia: "Ráa seu muleques!" Dia bacana, dia bacana.
Me lembro da minha professora da 1ª série ter me deixado de castigo depois da aula até as lágrimas do meu rosto secarem. Quem disse que eu conseguia parar? Mesmo assim, gostava muito dela. Obrigado D. Lucinha.
Na 2ª série minha professora foi a Tia Lia, e ela era tão calma, mas tão calma, que não se preocupava com nada que fizéssemos na aula.
Me lembro de quando fui para a 3ª série e quem dava aula era minha mãe, e sempre foi chamada de Tia Eni. Na escola ela sempre me tratava igual a todos professor/aluno, até o ponto em que começava a fazer bagunça, aí ela voltava a me tratar mãe/filho. Me lembro de um dia, na hora da merenda, eu ter feito algum tipo de molecagem que a fez pegar uma vara da arvorezinha em frente nossa sala e me bater na frente de todo mundo. Ninguém na sala riu, ou muito menos disse um pio. Talvez todos ficaram com medo de acontecer o mesmo com eles, rs. Desde então, passei a ser um aluno exemplar.
Me lembro que tudo que eu e minha irmã fazíamos de errado dentro de casa era motivo para apanhar. Papai sempre nos batia com qualquer artefato que lembrasse chicote: correia (especialmente uma trançada que ele tem até hoje) pedaço de mangueira, fio UHF, etc; tinha até um ritual na hora de bater. Por exemplo: quando eu e minha irmã brigávamos de bater um no outro, papai nos separava, depois, com voz de autoridade nos fazia abraçar, pedir desculpas e dizer que amávamos um ao outro, depois nos dava correadas, e sempre dizia antes quantas correadas iria nos dar. Enquanto chorávamos, contávamos as correadas até acabar. Mamãe era mais radical. Qualquer coisa que estava em sua mão ela jogava na gente: copos, panelas, chaminhas de fogão e se não tinha nada ela descia o braço mesmo. Coisas que hoje em dia não se pode ter mais, devido à lei severa contra maus-tratos com menor incapacitado (acho que é isso). Enfim, agradeço muito por ter sido da época em que pais podiam fazer isso, porque se não o fizesse, talvez eu não fosse o ser humano na qual tenho orgulho de ser hoje.
Me lembro do primeiro carro que compramos: um Monza-89 cinza. Era o Xodó da casa. Nunca deixou de dar problema em nossas viagens. Uma vez o pneu furou na estrada e o step estava no porta-malas debaixo da pilha de bagagens. Forramos um lençol velho no chão do acostamento e fiquei deitado nele, junto com minha irmã, mamãe e todas as malas, até papai conseguir trocar o pneu.
Me lembro lembro de quando caí do banco da igreja e cortei a língua (cicatriz até hoje)
Me lembro de quando fui para a 4ª série, na sala da Kivia Goretti, na qual gostava de ser chamada apenas de Professora Kivia, ou Dona Kivia.
Me lembro do meu primeiro beijo, atrás da da caminhonete que papai tinha depois do Monza-89.
Me lembro do infeliz dia em que tive apendicite. Doía pra caramba. Fui internado e me curaram, graças aos médicos que me tiraram isso antes de infeccionar mais. Hoje a cicatriz, que mais parece uma lagarta adulta, é o que guardo dessa época.
Da primeira festa em que fui. Na época, "Tira a camisa, levanta pro alto e começa a rodar..." era sucesso.
Me lembro da minha primeira transa. E me lembro que não teve nada parecido com esses filmes romântico. Então melhor  deixar só pra mim essa lembrança.
Me lembro do meu primeiro "namoro" sério. Não deu certo.
Me lembro das únicas duas vezes disse um "Eu te amo" sinceramente para uma garota: Maio de 2010 e Agosto de 2012. E posso dizer que eu faria qualquer coisa para deixá-las felizes.
Me lembro da primeira vez que pisei em um palco.
Da primeira vez que ouvi um elogio.
Me lembro de quando minha mãe me contou de seu passado, no qual me faz ter bastante orgulho dela pelo que ela é hoje. O que me faz ter mais orgulho ainda do meu pai, que, segundo a mamãe disse "ele foi a luz no fim do túnel em forma de olhos verdes que apareceu para ela".
Talvez por ser otimista, eu nunca vi dificuldade em minha vida. A falta do bem material era substituído pelo bem emocional que tínhamos e temos um pelo outro dentro de casa.
Me lembro de tudo que me deixa feliz.

Me lembro de muitas outras coisas. Mas são lembranças minhas. Certamente, para um segundo ou terceiro leitor, isso não passa de um simples pedaço de texto. Para mim, isso é um pedaço de uma simples vida. Vida minha, que não trocaria por nada nesse mundo.
Viva sua vida, e faça das suas lembranças uma inspiração para seu futuro.

Evoé.

5 comentários:

  1. Todo tipo de emoção possível eu senti lendo. Por que faz isso? Agora vu ser procurado pela INTERPOL. =( Irmão mala. Rs. Parabéns pelo texto, enchi os olhos d'água. :')

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  2. Será que posso ser procurada pela Interpol com você, Rafael?
    Não por "irmão mala", mas por "amiga emotiva demais".

    Jéfferson... eu não sei se tenho o direito de comentar sobre essa sua postagem, porque ela é de uma sincera intimidade que eu tenho até medo de estar me enveredando por um caminho que não me diz respeito.

    Mas, sendo um pouquinho atrevida, eu gostaria de dizer a você que o admiro muito. Não só pela sua tragetória de vida, mas também por tudo aquilo que você é hoje, ainda que eu não saiba o que o levou a ser assim. E o admiro por ser corajoso de se expor desta forma... E mais ainda por me fazer ficar, como disse o Rafael, sentindo todas as formas de emoções ao ler seu relato.

    Maldito pode ter sido o dia em que vocês colocaram fogo no campo, mas bendito foi o dia em que você veio ao mundo... Não é atoa que você é "Bendito", se é que me entende.

    Um super beijo. =)

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    1. Ô meu anjo, voce tem mais que o direito de comentar, por que esse texto é sobre minha vida, e você faz parte dela.
      Mais bendito ainda o dia em que te conheci.
      Um beijo

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    2. Não precisa nem de comentários.. *-*

      S2 .... S2

      =D

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