8 de julho de 2020

A Jornada (Parte III)

Quando tom acordou, não havia mais ninguém. 




Há anos sem se encontrar, trilhavam seis passos pela juventude os quatro amigos de outrora. 


Joel e Rick vez ou outra se esbarravam na pan house de sua cidade natal, onde ainda residiam com seus respectivos pais, mas raramente as conversas pesavam de meros cumprimentos formais e perguntas sobre Tom e Carlos. 


Estes dois, por sua vez, haviam voltado à pequena cidade apenas duas vezes após se mudarem para longe a fim de continuarem os estudos. 


No caso de Carlos, por falta de recursos financeiros. No caso de Tom, por falta de recursos financeiros e de vontade. O primeiro agora mora na capital e o segundo mora em uma cidade de porte médio, longe da cidadezinha e da capital. 


Os quatro amigos nunca mais se reuniram depois do término no ensino médio. 


Numa conversa com Carlos pelo computador, Joel relembrou o amigo das vezes em que se reuniram na casa do Tom para formarem a liga dos descolados. Eles riram bastante comentando de quando brincavam de ter superpoderes: Joel controlava objetos com a mente, Rick atirava raios com as mãos, Carlos lia mentes e Tom congelava coisas com as mãos. Todos os dias a liga se reunia, criavam bordões, cenários, intrigas e fantasiavam um teatro muito divertido. 


Joel não pode perceber do outro lado da tela que Carlos estava aos prantos. Ele era o que mais demonstrava saudade da época em que podia confiar totalmente nos seus amigos e que podia vê-los todos os dias. Carlos estava há bastante tem isolado em casa estudando. Só conhecia o caminho de casa para a faculdade e vice-versa. 


Na mesma conversa os dois também concordaram sobre o quanto seria do caralho um reencontro da liga, mas ambos sabiam que era muito difícil devido ao desentendimento grave entre os outros dois integrantes por causa de Jéssica. Antes do fim daquele ano final de ensino médio ela deu um pé na bunda do Rick e fez de tudo pra transar com Tom, que recusou inúmeras vezes os convites mais tentadores, com muita dificuldade.


Mesmo assim Rick não engoliu a situação e até hoje não acredita na inocência de Tom. Joel e Carlos sabiam que o amigo não havia feito nada.


Joel comentou com Carlos que sentia que a vida fazia muito menos sentido naquela cidade sem ele e Tom, e que às vezes ele sentia que nem mesmo fazia sentido estar vivo, porque tudo se corrói. Para não pesar o clima, Joel digitou uma risada curta e disse que aquela conversa já o contradizia, já que a distância era relativa. Joel digitou mais uma risada em seguida. Do outro lado da tela, Carlos chorava mais uma vez. 


Depois de mais alguns minutos de conversa, Carlos disse a Joel que se tudo desse certo, no fim do ano ele estaria de volta para as penúltimas férias da maldita faculdade. Desta vez, ambos estavam sorrindo. Joel respondeu que estaria viajando com sua família, mas que faria o possível para visitar o amigo em sua formatura. 


Ambos se despediram e desligaram os computadores. 


Joel se deitou e, olhando para o teto, se imaginou fazendo a faculdade de arquitetura que tanto sonhou. Dormiu e acabou sonhando com gafanhotos. 


Carlos se deitou e, olhando para o teto, chorou pela terceira vez, imaginando a liga dos descolados crescendo e enfrentando os obstáculos da vida juntos e sorridentes. Cada sorriso que imaginava aumentava mais o seu choro. 




Carlos não dormiu aquela noite, mas ao amanhecer ele acordou. Havia um céu gordo e frio no horizonte, mas parecia renovado. 

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