6 de abril de 2017

Camuflagem

       As páginas em branco da agenda do ano passado levaram para o fundo da gaveta todos aqueles planos que ninguém viu crescer. Lá no fundo fazem companhia ao álbum de fotos empoeirado e incompleto de 2012, com espaços vazios para os registros dos momentos especiais nunca vividos. Nas linhas em branco do diário do ano seguinte, sob o álbum, escondem-se todos os olhares que minhas mãos não souberam descrever. 

       Em meio a bagunça do meu quarto a estante foi a única coisa que permaneceu no lugar desde então. Ali dentro, discreta, camufla-se a terceira gaveta. Raramente a abro e, quando o faço, nunca encontro a mesma coisa. A agenda, o álbum e o diário sempre estão no mesmo lugar, mas os registros ali depositados às vezes me dizem muito mais que o óbvio. Toda vez que visito as páginas em branco, os espaços para fotos e as linhas vazias tenho a sensação de que uma versão de mim se perdeu para sempre. 

       Parece triste e nostálgico pensar assim - e de fato é - mas é também uma forma de me alertar sobre o valor das linhas que escrevo e dos momentos que ando registrando na bagunça da minha cabeça, na gaveta número 3. 

       Quais registros eu quero no velho álbum empoeirado que mostrarei para as visitas? Quais os planos para a agenda da semana que vem? Talvez eu encontre as respostas no futuro, lendo o diário do dia de hoje ou, quem sabe, esta nota. Contudo, como fazem as visitas ao fuçar o álbum de fotos, vou ignorar os espaços vazios.