Após o sopro
inicial do nascimento, a alma do homem segue um fluxo contínuo em direção ao
seu reencontro com o nada. Nesse caso, o conceito de tempo seria traduzido nas
marcas genéticas que afloram durante o amadurecimento do fruto homem somadas
com as lapidações e cicatrizes adquiridas através da relação com o ambiente. O
corpo é o veículo que dita a estética e suas transformações para a interação da
alma com o mundo físico, assim como as peças de um computador que capturam
estímulos externos para que os softwares possam trabalhar e então reproduzir o
conteúdo na tela. A relação entre corpo e alma, dentre outras coisas, também
exerce gravidade, quando passa a modificar o ambiente e as outras vidas ao seu
redor, ao mesmo tempo em que é influenciado de forma direta e indireta por todo
o ecossistema.
A
inconsciência do animal humano sobre suas características existenciais básicas
e sua influencia no meio externo, que em sua maioria envolve outros universos
particulares também inconscientes, muitas vezes acarreta na dificuldade de
interação e cooperação entre as pessoas em seus diversos grupos sociais, como
nos ciclos de amizades ou na família, o que também vale para povos, nações e
também pra humanidade como um todo. O homem é essencialmente diferente dos
outros animais justamente pelas suas capacidades altamente avançadas de
autoavaliação, comunicação, organização, inteligência, etc. Em outras palavras,
o que difere o ser humano das outras formas de vida é a sua consciência –
altamente ligada à moral - que funciona como um espelho que o faz olhar pra si
mesmo, provocando a reflexão. Quando deixa de se autoavaliar e não toma as
rédeas da sua interação com o meio, ele está sendo inconsequente com seu
próprio futuro, passando a assumir os altos riscos de imprevistos negativos. Um
forte empecilho evolutivo é que o homem mal saiu da sua fase de criança, onde
tudo é fantasia e não tem responsabilidade sobre seus erros, e está no meio do
processo de se descobrir pensador e capaz de grandes transformações positivas
no ambiente, que facilitariam a incessável busca da preservação não só da
espécie, mas da vida inteligente, até então única no universo, o que faz dele
próprio a coisa mais valiosa existente, juntamente com tudo o que já criou
entre tecnologia, conhecimento, arte, valores e etc. Enquanto amadurece, o
homem se dá ao luxo de errar incansavelmente para que, com sorte, aprenda a se
medicar.
Ao longo da
história, devido à sua inconsciência natural, o homem adolescente foi
inconsequente, como era de se esperar. Ao mesmo tempo em que produzia avanços
inimagináveis a ponto de não se limitar em pisar apenas na superfície de seu
planeta natal, produziu também uma série de relações altamente danosas à
preservação da espécie e do ambiente em que habita, como a destruição de boa
parte dos seus recursos naturais básicos e a precarização da condição da
maioria dos indivíduos da espécie. O homem, além de não conhecer seu lado
racional e transformador, também desconhece o seu lado animal e destruidor,
lado qual que se beneficiou do potencial inteligente e estratégico do homem
adolescente para aumentar sua eficiência autodestrutiva.
A luta do
homem é, então, contra sua própria natureza, que o desafia a amadurecer mesmo
que contra a própria vontade, com o propósito de preservar o que o universo
demorou alguns bilhões de anos para lapidar, conscientemente ou não. A luta do
homem é espiritual, física e mental. É uma luta contra o espelho, contra o ego
e, claro, contra seu inconsciente ignorante, que é naturalmente adverso ao
conhecimento em todas as suas formas. Sendo assim, os demônios que o homem tem
que encarar são bem mais fortes do que os seres malignos que já imaginou: eles
são reais, mas são invisíveis e estão cheios de boas intenções. São demônios
individuais, mas que podem nos levar ao suicídio coletivo, fazendo com que,
prematuramente, o universo adiante seu reencontro com o nada. Um universo vivo,
talvez, mas inconsciente de sua própria beleza.
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